
Nos resultados do Censo Demográfico 2022, divulgados nesta quarta-feira (9/10) pelo IBGE, a Bahia aparece com a maior proporção de trabalhadores que se deslocam a pé para o trabalho. São 27,6% da população ocupada, o equivalente a 1,2 milhão de pessoas.
O dado coloca o estado na frente de todo o país. Também revela que os quatro municípios com maior número de pessoas que caminham até o trabalho estão em território baiano: Cairu (77,8%), Saubara (77,2%), Firmino Alves (75%) e Santa Cruz da Vitória (73,5%).
Em Salvador, 130,6 mil pessoas (15,1%) iam a pé ao trabalho. Esse é o segundo maior índice entre as capitais brasileiras, atrás apenas de Florianópolis (15,9%).
Os números do IBGE evidenciam um contraste importante. Enquanto o automóvel é o principal meio de transporte no Brasil (31,7%), na Bahia o caminhar supera carro, moto e ônibus. O automóvel aparece em segundo lugar (20,0%), seguido da motocicleta (19,9%) e do ônibus (17,9%).
Para mim, o que mais chama atenção é como esses números falam de realidades econômicas e urbanas. Caminhar até o trabalho pode ser sinal de proximidade e sustentabilidade, mas, em muitos casos, indica ausência de transporte público acessível e baixa renda.
Tempo de deslocamento: 1 em cada 10 leva mais de uma hora

O levantamento mostra ainda que 452 mil baianos (10,4%) gastam mais de uma hora no trajeto entre casa e trabalho. Em Salvador, essa proporção sobe para 22,6%, a terceira maior entre as capitais.
Nas cidades menores, o cenário se inverte. Quatro em cada dez trabalhadores chegam ao trabalho em menos de 15 minutos, especialmente em Ipupiara (75,5%), Santa Cruz da Vitória (67,5%) e Firmino Alves (66,3%).
Esse retrato expõe as desigualdades regionais. Enquanto trabalhadores da capital enfrentam longos deslocamentos diários, muitos do interior vivem a poucos minutos do emprego. Isso reflete cidades mais compactas e com menos congestionamentos.
Menos pessoas trabalham fora do município e no próprio domicílio
Entre 2010 e 2022, a proporção de baianos que trabalham em outro município caiu de 7,9% para 6,7%.
O mesmo ocorreu com quem trabalha em casa. A taxa passou de 24,0% para 17,7%, atingindo quase 1 milhão de pessoas.
Em Salvador, 16,1% dos trabalhadores têm o trabalho principal dentro do próprio domicílio. É uma das menores proporções entre as capitais.
Essas reduções sugerem uma reconfiguração do mercado de trabalho, influenciada por fatores econômicos e pela transição pós-pandemia, que redefiniu as dinâmicas do trabalho remoto e presencial.
Educação: 1 em cada 20 estudantes estuda em outro município
O Censo mostra que 5,8% dos estudantes baianos frequentam escola ou creche em município diferente do que residem. Isso representa 216,8 mil pessoas.
A proporção sobe fortemente no ensino superior (31,1%) e na pós-graduação (35,5%). Isso revela a concentração das instituições de ensino nas cidades maiores.
Em contrapartida, nas etapas básicas creche, pré-escola e ensino fundamental a mobilidade é mínima, refletindo a presença de escolas locais.

Enquanto Brasília debate transporte urbano e políticas de mobilidade, na Bahia a caminhada ainda é rotina.
O que para alguns é uma escolha saudável e sustentável, para muitos é necessidade pura.
Esses dados do Censo não falam apenas sobre como as pessoas se deslocam. Falam sobre como vivem. Revelam o quanto o território baiano ainda guarda desigualdades históricas entre capital e interior.
A caminhada do trabalhador baiano é, no fundo, um retrato da resistência e da adaptação. Um passo de cada vez em meio às distâncias e às ausências do transporte público.
Os números do Censo 2022 mostram que a Bahia é o coração que mais caminha do Brasil.
Mas esse movimento também expõe o desafio de tornar o deslocamento mais digno, seguro e acessível.
Entre o passo lento da rotina e o corre da metrópole, está o retrato vivo da mobilidade e das desigualdades que ainda marcam o estado.