O Supremo Tribunal Federal concluiu nesta quinta-feira (2) a fase de manifestações nas ações que discutem a natureza jurídica do trabalho em plataformas digitais. Em até 30 dias, os ministros devem iniciar a votação do mérito. A decisão pode mudar as relações trabalhistas no país.
O debate gira em torno de duas ações: a Reclamação (RCL) 64018, apresentada pela Rappi, e o Recurso Extraordinário (RE) 1446336, protocolado pela Uber. Ambas contestam decisões da Justiça do Trabalho que reconheceram o vínculo empregatício entre empresas e trabalhadores de aplicativo.
Na primeira, a Rappi se opõe à decisão do TRT da 3ª Região, em Minas Gerais, que identificou subordinação jurídica e até “subordinação algorítmica” no caso de um motofretista. Já no recurso da Uber, a empresa questiona o entendimento do TST, que confirmou o vínculo de uma motorista.
O julgamento mobiliza o país. Mais de 30 entidades foram ouvidas durante as sessões de quarta e quinta-feira. Estavam presentes a Advocacia-Geral da União, a Defensoria Pública da União, sindicatos de motoristas e entregadores, além de associações patronais e órgãos jurídicos.
O impacto direto recai sobre milhões de trabalhadores e sobre o próprio modelo de negócios das plataformas digitais. Para mim, o que mais chama atenção é como o debate técnico e jurídico reflete, na prática, sobre a renda e a dignidade de quem depende desses aplicativos para sobreviver.
Se o STF consolidar o entendimento de vínculo empregatício, empresas terão que seguir regras mais rígidas de contratação, com pagamento de direitos trabalhistas. Por outro lado, isso também pode afetar a flexibilidade que muitos trabalhadores valorizam.
Entre os manifestantes estiveram representantes da Associação Nacional dos Magistrados do Trabalho, da Associação Brasileira de Mobilidade e Tecnologia, sindicatos de motoristas por aplicativo e até a iFood.
“Trata-se de uma relação de dependência econômica e operacional, com controle por algoritmos”, afirmou uma representante da Associação Nacional dos Procuradores e das Procuradoras do Trabalho.
Já entidades ligadas às empresas defenderam que a natureza autônoma do serviço precisa ser preservada. Alegam que há risco de colapso do setor se a formalização for imposta.
Enquanto Brasília discute cifras e conceitos jurídicos, nas ruas quem sente o peso é o cidadão que pega a moto às 7 da manhã tentando garantir o almoço. É preciso entender que, por trás do termo “uberização”, existe uma realidade de incerteza. Faltam férias, descanso e, muitas vezes, segurança mínima.
A decisão do STF será histórica, seja qual for o resultado. O desafio será equilibrar a proteção ao trabalhador com a inovação econômica que essas plataformas representam.
O Supremo decidirá em breve se o trabalho por aplicativo é emprego formal ou prestação de serviço autônoma. Até lá, motoristas e entregadores seguem no limbo jurídico, esperando que a balança da Justiça pese também para o lado humano.